Wednesday, February 20, 2008

7 questions with Abrão Vicente

Abraão Vicente autor de Alamarginal

1. Abraão conhecido que és pela tua actividade na média, como encaras o fenómeno bloggeiro que tem emergido entre nós?

Creio ser um privilégio para um país com as características de Cabo Verde ter uma comunidade blogues tão significativa. Por muitas razões. A primeira pela variedade temática. Segunda, pelo espaço possível de debate. Terceira, por ser uma alternativa aos media convencionais. Quarta, por possibilitar o exercício da escrita permanente. Quinta, novos opinions makers que só aparecem pela oportunidade de se construir blogues individuais. Sexta pela liberdade de opinião. Sétima, possibilidade de trazer para a discussão pública temas marginais.

2. O teu blog destaca-se pela originalidade do conteúdo, layout e até pela forma de abordagem de questões fugindo ao "lugar comum". Conta-nos sobre o "Crónicas Sujas".

“Crónicas Sujas” ou Ala Marginal parte do pressuposto de um exercício livre do acto da escrita e do uso da língua, tanto do português como do crioulo. As minhas crónicas não têm a intenção de agradar nem de agredir. São crónicas simples, dependendo o conteúdo e qualidade da escrita e do estado de espírito. As Crónicas Sujas são sempre consequência do meu olhar e do arrastamento das minhas outras actividades como estudante de ciências sociais, como pintor, como comunicador, mas sobretudo como alguém consciente do seu lugar no mundo.

3. Recentemente constatamos a exigência de um direito de resposta no teu blog da parte do ministério da cultura. Achas que o blog está conquistando um espaço ou não se deve levar a sério o que por aí se publica?

Os blogues são neste momento um suporte que não se possa ignorar. Provavelmente ainda não tenhamos a exacta noção da sua abrangência. Convém aqui salientar que, o direito de resposta foi exigido quase dois meses após a publicação do artigo. O que demonstra uma certa lentidão no acesso por parte de certas entidades às informações que circulam nos blogues. Muitas vezes o que se passa é alguém achar interessante ou polémicos certos artigos e promover a sua circulação por grupos de emails. Eu mesmo já recebi crónicas minhas por essa via. Mas nem todos usam o blogue como um instrumento de informação e debate, o que também é saudável.

4. Como artista o Abraão também inova utilizando o blog (http://abraaovicenti.blogspot.com) para partilhar quadros. Isso porque muita gente começa logo por questionar a garantia sobre os direitos do autor na web. Como vês essa questão de propriedade autoral?

A minha ideia em partilhar quadros na net é exactamente que as pessoas tenham acesso às imagens, as guardem no pc e partilhem com quem quiserem. Tenho a confiança de que as pessoas que o utilizem para ilustrar artigos na net, tenham sempre a gentileza de citar o nemo do autor. De resto eu acredito que nada substituirá a valor do original. Uma fotografia de quadro não é um quadro. Até hoje as revistas que têm utilizado as minhas imagens impressas têm pedido sempre a minha autorização, quando não mesmo recebo o valor justo pela publicação. De resto estamos num mundo em que partilha de informação é fundamental.

5. A tua ousadia em bulir com as nossas "vacas sagradas" tem gerado algumas polémicas. Como encarras esses tipo de reação das pessoas que não concordam com o que dizes?

Polémicas estão nas cabeças das pessoas. Eu quando escrevo opinando ou respondo a certas personalidades em certos assuntos é por acreditar que posso enriquecer o debate. Caso contrário não o faria. Confesso que saí muito desiludido nos embates com as tais vacas sagradas pela fraca capacidade de argumentação e alguma arrogância à mistura. Noutro plano as pessoas não têm que concordar com as minhas opiniões, de resto não é essa minha intenção quando escrevo. Contudo o discordar tem de ser um acto informado e não um mero dizer. Encaro a escrita e a reflexão como algo que deve ser responsável, por isso sei que só uma opinião estruturada e formada pode ser divulgada. Venho aprendendo muito com as minhas polémicas e as dos outros, no sentido de não me meter em disputas ridículas e descabidas. Não me reconheço na atitude dos nossos “intelectuais” e cronistas dos jornais da praça, pois grande parte deles apenas piam lugares comuns e passam completamente ao lado de um escrita séria, criativa e responsável. Passam ao lado da vida de todos os dias. Criei um blogue, pois acredito no que escrevo, porque não escrevo por encomenda.

6. Criatividade parece ser um dom que carregas. Qual é o segredo para te manteres sempre criativo?

Essa é uma pergunta que muito dificilmente me deixa espaço para fugir a um certo lugar comum. Se criatividade é um dom, acredita que também é algo que tem de ser extremamente exercitado para de facto se manifestar com DOM. Não considero que o meu trabalho na arte ou nos media tenha a ver com DOM, mas sim sobretudo com a atitude descomplexada com que encaro o acto criativo. Hoje em dia ser criativo é antes de mais estar (in)formado. Conhecer bem o percurso do campo onde trabalhas. Quem te disser “ hoje inventei” ou “hoje descobri” só pode ser uma de duas coisa: um génio ou um ignorante. É cada vez mais difícil criar algo totalmente novo, mas podemos inovar todos os dias.

Por outro lado, já tive o privilégio de viajar muito, de conhecer grande parte dos museus e galerias da Europa, hoje tenho acesso a todos eles quase diariamente on-line. Tive também a sorte de conhecer grandes artistas (por isso minha atitude extremamente critica em relação à arte[artes plásticas principalmente] em Cabo Verde). Pesquiso revistas e sites para aprender e manter-me informado. Claro, experimento sempre, faço questão de todos os dias sem excepção (a não ser que esteja em viajem) de entrar no meu atelier, dar pelo menos um risco ou rever o que tenho feito. De resto é manter-me alerta e atendo à vida.

7. Abraão, conta-nos o que é um artista?

Não tenho uma resposta definitiva. Mas posso dizer-te que normalmente a obra de artista demora anos de trabalho. Tal como a obra, o ser-se artista também é uma construção, um processo. Alguém pode nascer com o tal dom, muita sensibilidade, ser rebelde e todos aqueles clichés normalmente associado à imagem do artista, mas na minha opinião só a obra faz o artista. Pintar quadros, esculpir ou fotografar em si não fazem artistas. Tão-pouco são as exposições que fazem os artistas. O artista, para completar, é alguém sempre atento à vida, open mind, para aprender e aceitar mudanças. O artista, ao meu ver, é sempre radical no sentido de estar sempre insatisfeito com a sua obra. O artista é gémeo da sua obra. Sou apologista da ideia de que um grande artista é sempre um ser humano, para isso, o caminho de aprendizagem é longa. Estou no início dessa demorada jornada, ao contrário de quando era mais novo, hoje tenho muita paciência, não para esperar que as coisas aconteçam no seu tempo certo, mas para trabalhar.

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